segunda-feira, 11 de outubro de 2010

A MODA QUE A MODA É - Nilton Lee

Padrão de beleza. Qual é o seu? Na verdade não há padrão de beleza que suspenda ou aniquile a beleza real do ser humano, por mais “fora do padrão” que ele se encontre. Simplesmente porque o padrão não consegue ditar e fechar as portas diante do que enxergamos além dos olhos, e sabemos que o belo é o que nos fala a alma, tem mais profundidade, é mais extenso, denso e às vezes, até inexplicável.
Quem criou o tal padrão de beleza? A mídia? A moda? Ambas? A verdade é que a moda, esse consumo de objetos ou mesmo de idéias, se forma mais classicamente na perseguição obstinada da sociedade pelo padrão de beleza em vigor. Em vigor? Sim. Isso mesmo. Porque esse padrão é mutante, efêmero e questionável.
A moda dispensa qualquer lógica, transcende o caráter utilitário de uma peça de vestimenta ou adorno. Um dos fenômenos mais emblemáticos da pós modernidade, ela é a identidade e a identificação do sujeito perante a sociedade em que se insere.
Até os idos dos anos 70, no Nordeste, onde vivi minha infância, a cultura local dizia que a pessoa gordinha era sinônimo de prosperidade, além da clássica beleza estética, associava-se à sua imagem a figura de alguém que estava prosperando na vida. Era comum ouvirmos a expressão: “está bom e gordo?”, nos cumprimentos corriqueiros de rua entre amigos que se e encontravam. Era uma forma elementar de cumprimento.
“Tá ficando mais gordo, cada vez mais rico” – outra expressão, dava a entender que uma coisa estava sempre ligada à outra, naquela cultura que hoje não mais existe por conta do que nos impõem a moda e a mídia.
Na verdade é que nas pequenas cidades do interior nordestino a televisão demorou a chegar. Esse veículo de comunicação de massa só veio a ser instalado de forma a atingir todo o território nacional da maneira que ora presenciamos, nos meados dos anos 80. Com o advento da televisão, as culturas locais, tribais começaram a sofrer influência, e os padrões de beleza foram modificando de forma rápida, e seguindo a imposição da mídia, bem como da moda externa ao seu conhecimento até então.
Lembro que morava na minha casa, ainda na minha infância, uma mocinha vinda da zona rural, na verdade, de uma fazendola dessas escondidas nos fins de mundo do interior nordestino, onde dizem que Deus fez questão de esquecer.  Essa mocinha quando veio morar conosco na cidade, que já tinha acesso à TV, logicamente começou a sofrer a influência de tal veículo, como já acontecia com as colegas, com as novas amigas que constituiu na sua nova “aldeia”.
Estudava na cidade, onde morava conosco, e nas férias ia para o interior, para a roça. Lá, ao chegar, as pessoas logo faziam a observação: “nossa, como você está magra, menina. Não estão te tratando bem por lá?”. Até colocavam em cheque o tratamento dispensado pela minha família. Mas com o advento da antena parabólica se alastrando pelos povoados nordestinos, a televisão por fim chegou ao seu sitiozinho. Nas férias seguintes ao acontecimento, os comentários passaram de maldosos, para “Nossa, como você está linda. O que você faz para ficar com um corpinho assim? Me dá sua receita de  beleza”. A menina, que sempre foi magrinha, passou imediatamente de desassistida à padrão de beleza.
Kathia Castilho e Marcelo Martins, na sua obra “Discursos da moda, semiótica, design e corpo”.Colocam a seguinte  consideração:
“As mídias especializaram-se cada vez mais em construir mundos perfeitos, possíveis, desejáveis, prováveis, e tanto outros nos quais se espelham os sujeitos e seus destinatários. Todas essas criações estão pautadas em estratégias narrativas, discursivas e mesmo nas de textualização que geram tais efeitos de sentido de construções de mundo, aos quais subjaz, sempre, a de ilusão de que determinado produto, publicizado pelas mídias, é absolutamente necessário, desejável, querido, fundamental, imprescindível para seus possíveis consumidores.”
Queremos seguir o padrão. Queremos ter o padrão da beleza. Mas não seria melhor seguirmos o padrão da felicidade? O sofrimento das pessoas ante o preconceito imposto pelos seguidores da estética perfeita, ante mesmo suas dificuldades em manter-se no padrão de magreza que a “roda” cobra. Será se não é um sofrimento em vão?. Quão efêmera é a moda, quão fulgás é o conceitual.
Lembro bem que há alguns anos, o padrão de beleza repousava nas mulheres de grandes bumbuns e pequenos seios, pois bem, nisso lembro também que acompanhei o caso de mulheres de seios fartos que queriam se livrar deles, torná-los menores, como mandava a regra da moda. Para isso, e para justificar cirurgias de redução, algumas inventavam até mesmo problemas na coluna. “Ah, sinto muitas dores, porque meus peitos são muito pesados”, diziam.
O novo padrão é o de seios grandes. Sabe aquela dor de coluna? Sumiu. Que se danem as dores. Seios grandes estão na moda, é o que diz a mídia. Redução que nada. Silicone neles!
Efêmera, cruel, mas seguida, consumida, adquirida. Assim é a moda, na perseguição implacável ao padrão de beleza. A felicidade, porém, pode habitar em outros valores. Em você aceitar-se, curtir-se, respeitar-se e se fazer respeitada, amada e poderosa tal qual você é. Ninguém, afinal, vive a vida sobre uma passarela, desfilando roupas de griffe. A vida é mais que isso!

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